quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

"Queridos amigos"

Por trás do batom e do blush

Se você cruzasse com os atores Odilon Esteves e Ricardo Monastero na rua saberia dizer, com precisão, em qual produção da Rede Globo eles estão trabalhando? Assim, de cara limpa, fica um tanto complicado
saber que eles encarnam os travestis Cíntia e Brenda, respectivamente, em “Queridos amigos”.

— Acho difícil me reconhecerem. A gente muda muito para a minissérie. A voz, o jeito de andar, a postura... Mas acho isso bacana, porque é sinal de que a caracterização está impecável — diz Ricardo, de 23 anos, que antes só havia feito uma participação na novela “Cristal”, do SBT.

Odilon estréia de fato na TV. E não quis compor um personagem caricato e estereotipado.

— Ele é tão apaixonado pelo universo feminino que quis fazer parte dele. Fugi dos rótulos pejorativos que muitas vezes acompanham os travestis. Quis que Cíntia fosse muito humana — explica o ator, de 29 anos, que confessa ter ficado meio em dúvida se faria o teste para o papel: — Quando Daniel (Berlinski, o produtor de elenco) me chamou, fiquei receoso porque, em geral, no teatro, nas comédias, o tratamento dado aos travestis é de forma preconceituosa. E nunca quis fazer isso. Mas, depois que ele disse qual era o projeto e me mandou o texto, fiquei comovido e louco para entrar neste barco.

Passado o medo inicial, agora Odilon e Ricardo têm que enfrentar o lado “doloroso” de se viver um travesti. Eles demoram mais do que o restante do elenco para ficarem prontos e ainda precisam encarar depilação, escova no cabelo e, claro, o salto alto.

— Essa coisa com os pêlos é o mais chato. Passei a fazer a barba todos os dias, além de depilar pernas e peito por causa dos decotes — conta Ricardo, que segue um ritual assim que chega ao camarim: — Coloco o roupão e o salto, o que me ajuda na concentração. Os efeitos dos sapatos são muitos. Mas passo tanto tempo com eles que abstraí. Quando saio do salto, dói o pé, sinto as panturrilhas... Agora, faço alongamento nas pernas antes de colocá-lo.

Tanto Odilon quanto Ricardo acham que se “transformaram” em mulheres bem bonitas.

— Minha mãe disse que fiquei parecido com ela quando se casou. Gosto do que vejo no espelho. Acho que vou sentir saudade da Cíntia — diz Odilon, que deixou até as próprias unhas crescerem para não ter que usar postiças.

Crias do teatro, os dois atores confessam ficar embevecidos por contracenar com Fernanda Montenegro, que interpreta Iraci na minissérie.

— Em minha primeira cena com ela, Brenda fazia massagem em Iraci. Fiquei um pouco nervoso e não conseguia pegar no ombro dela direito. Dona Fernanda virou para mim e disse: “Pode pegar mesmo. Não fica preocupado, não”. Aí, passei a me sentir bem à vontade — conta Ricardo.

Já Odilon prefere ficar só olhando a mestra trabalhar:

— Ela só é a atriz que é por ser uma pessoa extraordinária. Sem estrelismo ou afetação.

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